Primavera (é) no Alentejo
Porquê este título? Porque o Alentejo é especial na primavera. A paleta de verdes do inverno cessante salpica-se de branco. O branco da flor da esteva – essa cistácea que tão bem caracteriza a flora do bosque mediterrânico.
Este ano as flores surgiram mais cedo: será a primavera precoce das alterações climáticas? Talvez. Seja como for, passear nos campos alentejanos, a partir de março até finais de maio, é uma ode aos sentidos. Há no ar uma alquimia de perfumes. O perfume das flores do rosmaninho e da marcela. Cheiros fortes que anestesiam a nostalgia e conduzem ao encantamento. Passear ao som do canto da cotovia e do melro ou da água que corre nos riachos – ainda cheios por esta altura – é pura magia. No final das tardes, o chilrear dos pássaros no silvado, na mata, no bosque, alegra e faz sonhar. Onde quer que estejamos, a vida pulula por entre ervas e arbustos.
As azinheiras, “velhas” companheiras do montado, esperam, serenas, pela chuvas de abril para beberem o suco da vida e assim permanecem até que a alma lhes doa e o corpo sucumba aos anos. Vale a pena conhecer essa típica fito-comunidade, pois a teia de vida que lhe está associada merece destaque. No montado encontrará: aves de rapina (e outras), pequenos mamíferos roedores (e não só), répteis, insetos e outros artrópodes. Uma comunidade biótica que poderá mostrar, por exemplo, às crianças, ajudando-as a compreender melhor a complexidade da Vida nos ecossistemas. Pois, como alguém disse: “só se ama aquilo que se conhece”. Um simples passeio na Natureza poderá, por um lado, transformar-se numa autêntica lição de Ecologia, por outro, constituir um pretexto para respirar ar puro, evitar o stresse das cidades e praticar um estilo de vida saudável.
Na primavera, a magia das aves e das flores nos campos intensifica-se e faz sonhar mais. Nas hortas, os laranjais (em flor) perfumam o ar. A noite chega de mansinho à planície (já) ensolarada. Sabe bem escutar o silêncio nos campos do Alentejo. O Alentejo genuíno e da tradição: das searas e rebanhos; do pastor de samarra e safões; do cante alentejano; da água fresca das fontes.
Ouvir o cante nas ruelas de Serpa… subir ao alto de Monsaraz e avistar o grande lago – Alqueva… caminhar na “vila velha”, subir ao castelo e apreciar o “Grande Rio do Sul” em Mértola… revisitar o circuito mineiro em S. Domingos ou no Lousal…
dormir na Corte Nova da Preguiça (em S. Luís, Odemira), apreciar a beleza do litoral alentejano e comer salmonetes grelhados (com molho do fígado dos ditos) na tasca do Celso em Mil Fontes… observar os mergulhões ao final da tarde, na Barragem do Roxo, e ir jantar ao restante “O Cabecinha” em Aljustrel… entrar pela Porta da Lagoa, caminhar até ao Templo de Diana e acabar a noite no Vila Galé, em Évora… descobrir os terrenos do mais famoso anticlinal do país - Estremoz, beber um café no “Central” e pernoitar na Pousada Rainha Santa Isabel…
Estes são, apenas, alguns dos muitos percursos possíveis de realizar no Alentejo – a região onde o silêncio invade os espaços e se prolonga para lá do horizonte…
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Publicado em Inominável nº 3
por Maria Sebastião, autora do blog Escrita ao Luar e
participante no blog Aprender uma coisa nova por dia