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Revista Inominável

A revista para lá da blogosfera!

Sex | 19.10.18

Animais & Mais | Treino positivo (parte dois, ainda contra o Cesar Millan)

Depois de ter ficado assente que não vou à bola com o Sr. Cesar Millan e as suas teorias, resta-me deixar aqui um pouco das teorias das quais partilho e, além disso, alertar para um facto: treinar um cão pode ser um verdadeiro desafio, e muitas vezes ouvimos falar no treino positivo, tentamos fazê-lo, e terminamos a não conseguir associar aquilo que pretendíamos que o nosso peludo aprendesse. E, claro, ficamos frustrados e temos tendência a desistir.

Malta, calma. É preciso antes de mais ter muita paciência, perseverança, constância, e saber que o animal que temos à frente está a aprender a falar a nossa linguagem; para ele deve ser uma frustração ainda maior não entender o que é que o seu companheiro humano quer!

O ideal, claro, seria levar um cão a um bom centro de treino, mas nem todos os donos têm possibilidades financeiras para isso. Portanto, vou deixar alguns conselhos exequíveis e muito básicos para treinarem o vosso amigo peludo.

Primeiro é necessário entendermos a definição de reforço positivo, que envolve a adição de um estímulo de reforço na sequência de um comportamento. E esse estímulo positivo, e agradável, faz com que seja mais provável que o comportamento que desejamos se repita no futuro.

Há muitas coisas que pode escolher como reforço positivo; por exemplo, o mais usado são os biscoitos. Algo bem saboroso e que o seu peludo adore!

Tente quadradinhos de fiambre de frango ou de peru (nunca porco), croquetes, pequenos e que não sejam duros, isto para que o cão não perca muito tempo a mastigar e se distraia. Acho que dá para entender a ideia.

 

Mas, e os cães que não ligam a esse tipo de reforço? Sim, porque os há. Eu já tive um assim. Para esse cão o maior reforço que eu podia dar-lhe era dizer-lhe efusivamente (e eu consigo ser bem efusiva) “LINDO CÃO” e fazer-lhe uma festa no lombo. Este cão de que vos falo aprendeu de tudo comigo, incluindo levar compras, ir buscar o correio para eu não descer as escadas, e sempre que o carteiro tocava à porta! Enfim… Era só pensar em ensinar e ele aprendia, mas nem sempre é assim. A nossa empatia era muito forte e isso contribuiu para o sucesso do treino. Há treinadores que usam um brinquedo como estímulo positivo, por exemplo uma bola. Mas por regra eles não recusam um bom petisco!!!

 

Resolvida esta parte, vamos aos princípios básicos do treino positivo.

Independentemente da técnica usada (e existem pelo menos três, dentro desta onda do positivo) é pertinente que tenhamos a consciência de que o cão deve ser imediatamente recompensado assim que executar a “ordem” ou comando” por completo. Só em alguns treinos mais complexos é que o reforço é dado de forma mais contínua, mas aqui só estou a falar do treino mais básico.

E pelo amor de Deus, não tenha os petiscos que vai dar como recompensa à vista do cão!!! Senão vai ter o bicho em estado de vigilância às recompensas ou então a babar-se! Eu costumo usar uma carteira de colocar à cintura, assim tenho-os sempre à mão e eles não os veem; claro que sabem que os temos, mas isso também pode abonar a nosso favor.

É importante que as ordens sejam simples e sem falas pelo meio

Durante o treino, nada de falar em demasia, isso confunde o animal e prejudica o treino!

Use comandos de apenas uma palavra, por exemplo “senta”, “deita”, “fica”, “junto”, e por aí afora. E tente, por favor, não usar mais nenhuma palavra além do comando escolhido pera o treino. Mais uma vez exemplificando, não diga “Senta aqui lindo, isso, senta” em vez de “senta”. Claro, eu sei que querem ser uns queridos e evitar comandos à exército, mas os nossos patudos estão a aprender a nossa língua e o que queremos que eles façam, por isso é necessário usar linguagem básica e simples! Têm oportunidade para serem queridos depois.

O sucesso do treino está no número de repetições diárias, sem frustrações

A chave do sucesso está nas repetições diárias, e lembre-se, os animais só conseguem estar focados no treino entre 10 a 15 minutos; se sentir que ele perdeu o foco ou está cansado, pare com o treino. Mais valem 5 minutos bem feitos do que o animal não estar a responder aos comandos devido ao cansaço mental. Como vê, não é assim tanto tempo que tem de dispensar para o treino, e além disso verá que a vossa relação sairá reforçada.

Esta regra é MUITO IMPORTANTE: explique o seu método de treino ao resto da família e atuem todos da mesma forma. Não pode ter um membro da família a dizer para ele ficar quieto e afastado, isto quando estamos no horário de refeição humano, e por outro lado há uma pessoazinha a dar-lhe comida às escondidas! Por favor, sejam coerentes! E isso é válido para tudo! Não podemos ter um cão confuso a não saber o que fazer e a achar que os humanos são uns seres muito estranhos (não que isso até nem seja verdade…)

É também importante que não façam do vosso cão o bobo da corte! Imaginem, ele aprendeu a sentar-se! Ó que giro!!! Um cão treinado!!!! Então todos, e mais alguns, lhe dizem o comando “senta” e ele vai fazendo… e fazendo… e fazendo… Até se fartar! E depois temos uma situação em que necessitamos que ele obedeça ao comando e o patudo manda-nos bugiar, e com toda a razão.

 

O TREINO EXISTE PARA FACILITAR A NOSSA CONVIVÊNCIA COM OS NOSSOS PATUDOS E ENSINAR-LHES UM POUCO DA NOSSA LINGUAGEM E O QUE É ESPERADO DELE, NÃO PARA FAZER DELE UM PALHACINHO!

Quando eu percebia que alguém estava a dar alguma ordem ao meu cão sem ser necessário, acabava logo com a diversão! Houve uma altura em que o ensinei o “dá 5”, que era para ele bater com a pata na minha mão; a criançada percebeu que ele fazia isso e uma vez em que fomos à aldeia, quando dei por isso havia uma fila de crianças para ele “dar mais 5”!!! Tudo bem, era giro, mas ele não era o bobo da corte!

Ensinei-lhe o comando para ele cumprimentar quem fosse lá a casa, era engraçado e uma forma de interação, não um divertimento para humanos, ok?

E quem diz com esse comando, diz com outro também. Na rua toda a gente adorava mandá-lo sentar. Eu já estava cansada de dizer que só eu podia dar ordens, foi a desculpa que arranjei para não ser julgada como antipática. Não adiantava mesmo estar ali a explicar os princípios do treino!

Ordens e comandos são para serem feitos como o açúcar e o sal, é QB! Sempre que necessário. Por exemplo, quando precisamos que esteja quieto, dizemos um “senta” ou um “deita”. Além disso ele vai percebendo, consoante as situações em que nós usamos as ordens, como tem de se comportar em determinada situação. Eles aprendem e apreendem muito bem!

É também importante que não passemos para outro comando se o primeiro não estiver bem aprendido. Por exemplo, começamos com o “senta” e fazemos uma série de repetições, e ele ainda não percebeu. Está na hora de parar o treino e só no dia seguinte é que voltaremos a ele. Não vamos agora passar para o “deita”! Se ele ainda não aprendeu o “senta”, continuamos até que esteja compreendido e só depois passamos para outro comando.

Também é preciso saber que no início a recompensa em forma de petisco será sempre fornecida; depois, quando percebemos que a ordem foi entendida, começamos a diminuir o petisco, primeiro dando de forma aleatória, até deixarmos de dar. Mas, muita atenção, manter sempre o reforço verbal, como o “Muito bem” ou um afago. No entanto pode, de vez em quando, reforçar também com o petisco. Isso não é errado, e não é viciar o animal em petiscos. Afinal de contas, ele está a fazer o que queremos, não merece recompensa por isso?

Não dê ouvidos às más-línguas invejosas que dizem “Ah! Ele só faz o que tu lhe dizes porque lhe dás biscoitos”! Não, meus queridos, ele tem o biscoito porque ele percebe o que lhe digo, porque merece e se esforçou para entender o que eu quero. Deixemos para trás todas essas ideias antigas e ultrapassadas.

Além disso, e tal como disse, teremos sempre cães diferentes no treino.

Tal como já falei, tive um que se lhe dissesse “Que lindo cão!” era como se lhe tivesse dado todos os petiscos do mundo e mais alguns! Notava-se uma plena satisfação no cão, que não ligava aos biscoitos mas às minhas palavras e afagos. Neste momento, tenho um cão que vende a alma por petiscos, aliás por comida no geral, e quer lá saber se é lindo ou não!!! Claro que ele já obedece se não lhe der o petisco e só fizer o reforço oral, mas agradece efusivamente se a recompensa vier em forma de alimento. Qual o problema? Para mim, nenhum.

Aliás, com ele a hora de refeição coincidia com o tempo de treino, assim estava a treinar e a comer a medida do dia que lhe pertencia. Caso contrário, por esta altura eu não tinha um cão mas uma bola de gordura! Nesta fase, e com o treino já aprendido, volta e meia depois de uma ordem cumprida eu reforço com um petisco, ficamos os dois satisfeitos! Só tenho é de controlar para não dar alimento a mais.

Importante, malta, cuidado com o que vocês reforçam. Os nossos animais estão sempre a aprender e podemos estar a reforçar comportamentos que não queremos. Ora imagine, o seu cão ladra para lhe abra a porta; se você o fizer, o que acha que acabou de acontecer?

Acabou de lhe ensinar que se ele ladrar consegue o que quer! Acabou de reforçar o latido! Tcharam!!!

Outro muito comum: se o seu cão pula para cima de si para o cumprimentar quando chega a casa, e você o acarinha, conversa com ele enquanto está em pé, o que é que acabou de reforçar?

Acabou de reforçar o pular!!! Se com cães pequenos até pode ser pacífico, imagine com um Labrador grande e entusiasta!

É importante, principalmente no início, quando o patudo está a apreender tudo sobre o seu novo lar, que analise as suas ações. Leia sobre estes temas para poder perceber o que pode estar a fazer de errado, veja vídeos, muitos vídeos - aconselho os da Cláudia Estanislau (excelente treinadora e portuguesa) ou do brasileiro Tomás Szpigel, ambos têm muitos vídeos na internet. O Tomás tem um fórum sobre adestramento (no Brasil é assim que se diz). Leiam e procurem saber bastante sobre o tema, afinal o vosso amigo e a vossa convivência futura merecem.

Se por acaso decidir procurar um treinador, procure um que saiba que faz treino positivo, que saiba que irá tratar bem do seu cão. Peça opiniões. Em Portugal, felizmente, já vão existindo alguns em quem podemos confiar. Obviamente não são aqueles ex-GNR a quem o pessoal aqui no norte tinha o mau hábito de entregar os seus cães para treinar. Por favor, não façam isso. Nada contra a GNR, mas sim contra métodos de treino completamente obsoletos.

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Publicado em Inominável nº 16

 por Golimix autora do blog Eu tento, mas meu tento não consegue

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